"Bendito o que semeia livros à mão cheia e manda o povo pensar!" (Castro Alves)

Frentistas/consumidores

Livros publicados





Olhai por nós  Apresentado por Valdez Cardel, em 2006. Romance que mescla os gêneros policial e social. Inicia-se com o “achado” forjado da imagem de Nossa Senhora. O “achado” da Mãe de Jesus acaba fugindo ao controle dos estudantes que o planejaram e, por chegar até à devoção popular, acaba movendo o interesse escuso de um delegado corrupto da Polícia Federal, que, controlando o tráfico de drogas de dentro do órgão que o deveria reprimir, vê no “achado” uma possibilidade ímpar de transformá-lo numa mega máquina de fabricar dinheiro. Como o delegado Mateus já era um dos dirigentes da Igreja Global do Evangelho Único de Jesus, da qual se torna dissidente e funda a Igreja Mundial da Sagrada Família, reedita o antigo encontro entre a Mãe de Jesus e o Espírito Santo. A mistura perigosa traz um crime descortinando a narrativa e um assassino sendo desvendado no final, com a surpresa de que o cenário não é o tradicional londrino ou nova-iorquino, mas amazônico.





 


Memórias quase póstumas de um ex-torturador – Prefaciado por Juruema Bastos, foi vencedor do Prêmio Instituto de Artes do Pará de Literatura-2006. Ao completar os seus oitenta e seis anos, o personagem-narrador Pedro, que foi torturador oficial nas ditaduras Vargas e Militar, recebe a inusitada visita de “Deus” e do “Diabo”, para o “acerto de contas”. Na companhia das duas “divindades”, enquanto Emilia Maria, sua esposa, rega as plantas em torno da casa, Pedro faz uma viagem à sua infância, onde se vê, antes de fugir de casa, submisso à violência do pai. Inconformado com a morte da mulher durante o parto que trouxe Pedro ao mundo, o pai o passa a surrar com freqüência e o tenta registrar no cartório com o nome de Mata-Mãe. Saindo de casa, no tempo presente, em companhia de Deus e do Diabo, ao mesmo tempo em que caminha contra a sua vontade ao cemitério, Pedro dá continuidade à narrativa, passando pela casa do português que o criou e nas dependências do DOPS, onde exerceu suas atividades de torturador. A ida involuntária ao cemitério vem explicar, entre outros, o porquê do uso contínuo do lenço de seda em torno do pescoço por Emília Maria, bem como sua obsessão por regar as plantas em volta da casa.

As cartas anônimas de Robledo Prefaciado por Carla Fagundes, teve seu lançamento em 2008. Robledo, que é citado em Memórias quase póstumas de um ex-torturador por ser aquele que, por morte, deixa o lugar de chefe no DOPS para o torturador Pedro, tem o hábito pouco peculiar de escrever cartas anônimas e introduzi-las por baixo das portas alheias. Por essa razão – diz o livro em sua abertura -, irá morrer de bala transpassado. Robledo morrerá precocemente – ele próprio tem certeza disso -, não obstante, em sua curta passagem por esse mundo, irá interferir visceralmente no destino dos que o cercam. Será assim com o da tia Agripina, que o criou após a morte dos pais. Será assim com o irmão de criação Aderbal. Menos diferente não será o destino dos que lhe são vizinhos, inclusive Rosalba Antonieta, por quem ele jurará amor. Todos são vítimas da mira cruel da caneta de Robledo, até a prostituta Lola com as suas “funcionárias”, no entanto, a cair sob maior martírio, estão o padre Celestino e a irmã Assunção, cujo relacionamento amoroso   é alvo da chantagem do ainda seminarista e inventor – segundo ele próprio em seu epitáfio – de um “gênero literário, dramático por excelência, cujo personagem maior é o próprio leitor e cuja obra culmina irremediavelmente  com o fim do próprio autor”. 



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Engatinhar literário


                        Em geral, os autores são definidos em sua obra por períodos, para, talvez, serem melhor compreendidos. Mérito à parte, eu costumo classificar o meu primeiro conjunto de manuseio com as letras de “engatinhar literário”. Separo esse primeiro período tomando para mim um conselho dado por Mário de Andrade a Fernando Sabino, quando o ainda imberbe escritor mineiro “ousou” lhe enviar para apreciação os seus primeiros contos. O já consagrado escritor Modernista disse mais ou menos assim: “Se tens vinte anos, andas a ler, que esse é o caminho. Se tens quarenta, pára”. Caso a essência disso com o que um maestro diria a alguém que possuía alguma iniciação musical mas gostaria de tocar piano aos quinze.
                        Na casa dos saindo dos dezoito e entrando no caminho dos vinte e poucos anos, compus num bloco de mesmo fôlego uma novela, quatro romances, dois livretos de poemas, dois livros de contos em parceria com o Flory e participei de uma coletânea de poemas. O conselho de Mário de Andrade me chega justamente na conclusão do romance Clareira, que foi o meu TCC de Letras, em 1988, na Universidade Federal do Pará. Como eu tinha vinte e poucos anos e avistei no que tinha produzido, salvo os contos de conteúdo humorístico, um veio quase que eminentemente ligado à minha militância política ao Partido Comunista do Brasil, parei de escrever e fui ler. Não suspendi a pena naquele instante, é bom que se diga, em razão da ideologia predominar à criação, mas sim pelo fato de ela se encontrar a milhas de distância da qualidade do que fez, por exemplo, um Brechet, Maiakovsky, Vianinha e Jorge Amado.
                        Ajuda a emoldurar essa “fase” o fato de que toda ela não veio a público por intermédio dos canais normais de editoração. À exceção da coletânea de poemas Enluadonovo, que foi rodada em cem exemplares, em mimeógrafo, os restantes não superaram a cota de dois exemplares. Escrevi-os na velha máquina datilográfica, cortei as folhas de papel ao meio, passei cola nas bordas, desenhei a capa e, pronto, lá estava um livro a rodar no círculo de meia dúzia de leitores.
                        Inicia-se esse período com a “publicação”, em 80, de um Um pato na terra do tucupi. No mesmo ano, veio Duelo de tesouras. Ambos são constituídos de contos humorísticos, escritos em parceria com o Floriano Peixoto, o Flory. Contos de ambos foram publicados no jornal PQP – Pra Quem Pode. Duelo de tesouras se perdeu no tempo. Um pato na terra do tucupi se salvou para contar a história desse começo:    


                        A seguir vieram os livretos de poemas Quem ficar chorará e Inciso. Os dois tiveram o mesmo destino de Duelo de tesouros, sumiram em sua trajetória de leitura.
                        Na sequência, em 82, chegou o primeiro esboço de romance, a novela Harpia, que conta a história de um grupo de hippies em que a personagem principal, Luci, abandona a casa do pai, um coronel do Exército, e vai viver com Força, o líder do grupo. A história contesta a Ditadura Militar vigente, mas não se enquadra diretamente aos preceitos comunistas. Não obstante, a influência partidária vem implícita, no instante que os pobres hippies são tão idealizados que não fumam nem “maconha”.   

 
                        Em 83, vêm os romances Centelhas da incoerência, baseado na história de meu pai, que, durante a II Guerra Mundial, sendo soldado do Exército e acusado de extrair os dentes para não para o front, foi preso como desertor por sete meses, e Esgotos, que conta a história do mendigo Rato e de uma série de assassinatos de policias militares cujos uniformes são levados depois para diante de uma delegacia de polícia. No mesmo ano, participei da coletânea de poemas Enluadonovo, ao lado de escritores como Pedro César Batista, Ernane Maurity, Júlia do Vale, Silas Miranda e Adelma Pimentel.   


                                            
                        Escrito em 84, mas “editado” apenas em 88 para servir como TTC de Letras, na UFPa, vem Clareira. A história acontece num lugarejo localizado num ponto da região amazônica, onde se instala uma usina mineradora de alumínio que usa como escrava a mão-de-obra dos habitantes do lugar.  


 



Além do campo das letras


                       Concomitante aos primeiros passos na literatura, arrisquei minhas primeiras pinceladas a óleo nas telas. Ficaram ali, vendidos quase que “sofridamente” na Praça da República, as trabalhos iniciais. Voltei a pintar em 97 e, durante esse período, realizei exposição dos meus quadros no hall da Gerência do INSS, em Belém, no Hotel Farol, na ilha do Mosqueiro, e no Restaurante Álibi, em Santa Isabel do Pará. 
                        A seguir, alguns trabalhos: Angélica (Horácio Ferreira e Angélica Ribeiro), Chuva e sol (Sérgio Pinto),  Mar agitado (Do Carmo Ferreira), Nuances de Eros (Alexandre Vilanova), Auto-retrato (casal mineiro em Carajás), Vaso à janela (Clóvis Maurity), Vaso sobre lâmina d'água (Tereza Conde) e O Abraço (João Amarildo).

                       Na música, lá também no tempo dos primeiros passos literários, produzi alguns trabalhos sozinhos e outros em parceria, que concorreram em festivais universitários, como “Paz, terra e pão”, defendida por Edilson Moreno em um dos festivais das FICOM, hoje UNAMA, e “Alucinação”, composta em parceria com o Ernane Maurity e apresentada pelo Coral do Instituto Carlos Gomes na UFPa. O retorno à música, todavia, está distante de atingir o progresso visto na literatura e na pintura. Em 2006, reuni com parceiros como o Flory, o Ernane Maurity, o Sant Clair do Baixo e o Eduardo Dias, umas “composições de gosto duvidoso”, além das vozes da Carla, Silvana e Mohara, e criou-se  o Grupo Frieira. O resultado deu no kit constituído do CD “Bregas e outras porcarias” e no “porrete” para quebrar o disco no final da primeira audição. A justificativa para a existência dessa “coisa” está na contra-capa do CD.



Baixar CD Grupo Frieira 


http://www.4shared.com/file/-PpxEMfG/10_-_Despachando_a_sogra.html

                 Certamente que o CD do Grupo Frieira é uma grande brincadeira. A gente costuma também se reunir para cantar coisas boas, como o show "Santa Isabel Canta Chico", apresentado no Restaurante Amazônia. Da esquerda para a direita, Guto, Sheila, Carla, Marina, eu, Conceição, Mohara, Felipe e Ernane.



                           E, incluindo a Kátia e o Edward Jr., no Teatro Gasômetro, durante o lançamento do livro de Pedro César Batista, evento que compôs o Fórum Social Mundial:





 













Antídoto blues

Música chata para ser usada por cantores da noite contra pedidos antipáticos


Troca de óleo e ideia 



Criado o Memorial dos Lutadores do Povo do Pará 


Foi criado no último dia 6 de dezembro, durante ato na Assembléia Legislativa do Pará, data do 22º ano do assassinato do deputado João Carlos Batista, o Memorial dos Lutadores do Povo do Pará.

A iniciativa tem a finalidade em organizar um acervo com documentos, objetos, fotografias, materiais em audiovisual e depoimentos que resgatem as lutas desenvolvidas no Pará na segunda metade do século XX. Esse trabalho fará uma pesquisa histórica que possibilite o estudo, a pesquisa e o conhecimento dos lutadores e lutadoras do povo no Pará, para que se tornem referenciais a juventude e as crianças diferentes dos apontados pela mídia e pelas classes dominantes. Possibilitando ainda mostrar a história das lutas travadas no período a ser pesquisado para a organização do acervo.

O Memorial dos Lutadores do Povo do Pará buscará parcerias com organizações públicas e privadas para criar as condições necessárias para reunir o acervo que resgate os lutadores e as lutas dos trabalhadores no campo, na cidade, nas comunidades, em atividades culturais, de gênero, das minorias e estudantis ocorridas no estado.

O ato de criação contou com atividades culturais. Carla, João Bosco e Ernane, do grupo Frieira, apresentaram canções relacionadas as lutas do povo, em seguida o grupo A, corda Bamba apresentou sambas que falam dos movimentos de resistência. Antes de iniciar os debates os poetas Luis Alho, Márcio, Nilton Silva, Samir Raoni e Pedro Batista declamaram poemas.

Na reunião foi apresentada a proposta para a criação do memorial, aprovada por aclamação. Em seguida debateram e aprovaram o Estatuto para as providencias legais, por fim elegeram o Conselho Gestor e o Conselho Fiscal. Participaram ativistas ligados as lutas camponesas, estudantis, sindicais, lideranças partidárias, historiadores, jornalistas, escritores, cientistas políticos, advogados e religiosos de Belém e do interior paraense, Ipixuna do Pará, Moju, Capanema e Barcarena.

A primeira etapa prevista durante a reunião será a elaboração de um plano de trabalho para definir o roteiro da coleta de materiais que integrarão o Memorial dos Lutadores do Povo do Pará. Todas as falas deixaram claro a importância do trabalho para a formação política e ideológica da militância dos movimentos sociais e de toda a sociedade.




  As “feiticeiras” de cada esquina nossa

       

   Numa dessas madrugadas, em que se acorda no vazio, peguei-me respondendo sem querer a uma enquete de rua na TV. Era uma rua qualquer desse mundo. O repórter perguntava às pessoas se elas acreditavam em “feiticeira”. A princípio, o meu sarcasmo instintivo aprumou o travesseiro sob a cabeça e preparou a descair as primeiras palavras. Não obstante, uma espécie de força contrária, levando a coisa a sério, tomou a dianteira e passou a responder, anulando o primeiro ímpeto.
           Sim, sim, eu acredito em “feiticeira”. Antes de dizer que elas estão amoitadas sob a copa das mangueiras de parte das esquinas de Belém, dividindo o espaço com o calor, às vezes com o lixo, com os flanelinhas, com o acelerar dos passos para correr da chuva, com o buzinar abominável dos carros, com o contagiar da conversa de uma gente bonita e festiva que se doa naturalmente como tema para o ofício de qualquer artista, digo de onde elas vêm. São procedentes todas elas, mesmo as que aqui chegaram de forma enviesada, à semelhança das “baianas” nascidas fora da Bahia que vendem acarajé por esse país afora, do mais profundo da floresta, lá onde somente os mistérios possuem credencial para circular.
          Lá, por exemplo, foi moldada a maniva, a espécie de “vaca da amazônia”, da qual se aproveita tudo.
         Com a cautela para não transpor ao sabor pejorativo, não chamamos a essas mulheres diretamente de “bruxas” ou “feiticeiras”. Antes, damos-lhe a denominação carinhosa, em função de sua porção mágica, de “tacacazeiras”. Sim, sim, nelas é que eu acredito como mulheres com poderes além das outras, que se põem, curvadas e com sorrisos largos e ardilosos, a mexer os seus dois distintos caldeirões de bruxaria, esses, que por sua vez, seja manhã, tarde ou madrugada, sejamos nós acompanhados do almoço, janta ou lanche, sejamos nós acompanhados da mais plena fome, ainda que a razão de existir do feitiço não seja para matá-la, mas para despetalar um desejo, nos enlaçam as narinas e a boca e nos sacam de forma quase irresponsável do trajeto original.
          Mescladas as duas porções, a que elas chamam de “goma” e “tucupi”, num recipiente também exclusivo parido na mata, que atende pelo nome de “cuia” e que é quase um ingrediente, nos é servido então o “tacacá”, completado assim com a adição de mais dois imprescindíveis componentes: o camarão e a “folha que treme”. E aí nos quedamos à mais misteriosa das feitiçarias, ela que é assexuada ao paladar, que não sabemos explicar, leigos ou gastrônomos, se é comida, se é bebida, sopa, chá, se deve ser consumida antes, durante ou depois (depois de quê?), e que não desabona os que acabaram de sair da missa e trazem o conforto da comunhão ao sincretismo do templo da boca, os que vão ao cinema, ao teatro, ou ao campo de futebol, os que saem ou voltam para casa... ou os que, após deixarem órfãs as cuias, aproveitam o tremor do jambu e o atiçar da pimenta e trocam um apaixonado beijo de língua.

João Bosco Maia
(Publicado em O Liberal, de 14.01.11




Edilson Panjoja comenta Memórias...

  Em “Memórias quase póstumas de um ex-torturador”, do paraense João Bosco Maia, romance vencedor do “Prêmio IAP de Literatura”, 2006, um homem, imerso num cotidiano decrépito e anódino, e aos oitenta e cinco anos, recebe, num diagnóstico médico, a revelação de que dispõe de apenas dois meses de vida. Recebe também a visita de dois surpreendentes personagens. Com estes, numa espécie de revisita e prestação de contas do obscuro passado, tem que dividir as próprias memórias. Estas, permeadas de atos questionáveis sob diversos ângulos, no que se inclui o ético, embasam-se numa biografia cuja trajetória não se explica senão pela maldade. Quanto a esta, maldade, se não se pode afirmar, com base nas prerrogativas do romance, que seja inata ao homem em geral, pode-se pelo menos supor que seja inerente a alguns homens. Estes, porém, nada extraordinários (para lembrar Maquiavel e Raskólnikov).
       Extraordinário, aliás, seria o sistema político que, em nome da suposta segurança e interesses do Estado, gera em seu ventre medonho homens com tal disposição. Seria. Pois, como denuncia o filósofo Giorgio Aganbem, as democracias contemporâneas têm lançado mão dos chamados estados de exceção como recurso de controle e vigilância dos cidadãos, privando-os de seus direitos, de sua vida. Na concepção de Aganbem, tal recurso se tornou tão corriqueiro, que deixou de ser excepcional, constituindo-se, na verdade, um padrão de atuação dos Estados democráticos.
     Pedro, o personagem em questão, dono de uma personalidade ridícula, foi torturador, funcionário do Estado brasileiro autoritário. Mas o aspecto ridículo que o caracteriza não o é apenas por ter ficado no outro lado, o ativo, do ato de tortura nos infames “porões” da ditadura. Pedro é assim porque, como suas vítimas, não passa de uma peça na grande estrutura de poder ante a qual homens são como insetos; animais preocupados com a fragilidade do próprio abrigo; criaturas culpadas pelo simples fato de existir… Ainda menino, teve que fugir de casa para escapar das maldades do pai, que abusava da própria filha – protetora do menino -, e o surrava, cotidianamente, com hora marcada, independentemente de qualquer travessura.
      Pedro é um homem de seu tempo. Nascido justamente quando a mãe falecia, motivo pelo qual recebeu por toda a vida o ódio do pai, fez-se ante a ausência de referências e certezas basilares. Pedro é um homem perdido, cuja existência se fez à base de mentiras, fingimentos, ficções. Perdido também resta o leitor, quando, ao final, maravilhado com os rumos tomados pela história do personagem, sente a mesma esvair-se ante sua vista, ante suas mãos, num exemplo do que disse alguém acerca da modernidade. Nesta, afirmou, tudo o que é sólido se desmancha no ar.
       Resta, porém, a admiração com o talento e a louvável capacidade narrativa de João Bosco Maia. Sem dúvida, um dos nomes da nova – e boa! – literatura paraense. Ou melhor: literatura brasileira. Melhor ainda: Literatura.

(extraído do sítio Coluna Crítica)
 
 


Mesmo engolindo o abominável “bolsa bandeira”...


          Agarro-me ainda num filete de esperança a uma forma mais justa de governar e, antes, de atingir o poder. Por isso, declaro o meu voto – de artista escritor talvez - para Ana Júlia. É-me muito caro ver a doação (espero que sazonal, em nome da tal estratégia) da indulgência ao maior dos corruptos do Pará, do mandante do massacre em El Dourado e do falso oftalmologista (não cito nomes em razão do pavor em ser processado e sentenciado por “crime de calúnia”). É-me tão igual caro ter que fazer essa opção pela candidata que aquiesce com essa legião de famintos , chamada antes apaixonadamente de militância, que, por dez reais, sacode nas ruas a bandeira com a sua propaganda política. Ainda que discordando com esse tipo vergonhoso de “distribuição de renda”, ou “bolsa bandeira”, procedimento historicamente adotado pelos inescrupulosos, jamais me inclinaria a dar apoio a esse grupo que sempre fez pouco caso dos direitos elementares do homem e que, para atingir o poder recorre a métodos subtraídos ao fascismo, como a utilização de temas de ordem religiosa e sexual. Ou argumentos ridiculamente deprimentes, como se fôssemos idiotas, tal esse sobre parte da copa do mundo que será jogada em Manaus...

Primeira Parada do Orgulho dos Sem-Orkut e Genéricos

          Por muito pouco, nos últimos dez anos, não cedi à febre que se abateu sobre a epiderme das pessoas do mundo inteiro e não mandei estampar uma marca indelével em qualquer ponto visível da minha própria pele. Como todo sujeito que esteve escudado apenas pelo antitérmico do seu fórum íntimo, caí no constrangimento peculiar que sofre as minorias ante a mira de olhares, quer nas vias públicas, quer no trabalho, a vasculhar sobre a minha figura à procura da tal tatuagem. Cadê a prova cabal - indagavam-se as retinas - de que eu não era um diferente e, por conseguinte, não estava contido no quadro da grande maioria? 
         E não estava mesmo. Por opção, eu pertencia ao grupo ínfimo, diferente, que se fecha em si mesmo e evita confrontar-se com a carga de escárnio, piadinhas maldosas e coisas do gênero que costumam vir do lado oposto. Por muito tempo, por exemplo, deixei de ir à praia, na intenção de evitar que, ocupando eu o menor traje permitido e longe das mangas compridas que eu recorria para proteção, aparecesse aquele menino e dissesse à mãe, abismado: “E ele fala!”
          Não é de outra forma que resisto à febre quase que terçã do orkut, embora tenha experimentado entrar ultimamente no seu primo-irmão de tolice e vazio, o “facebook”.
          Formulei esta posição a partir da contramão da sugestão de algumas figuras, de renome nacional ou próximas, que falavam entusiasmadas da nova maravilha. Ora, não é conceituação prévia, mas sempre é bom e recomendável seguir no sentido contrário ao que prega uma Xuxa, Carla Peres ou Gugu Liberato.
          O quê?! Você não tem orkut?! - quantas vezes me vi ilhado por esse tipo de indagação e tive de sair de fininho para não cair no alvo da ridicularização...
          Se saímos, minha família e eu, ilesos à onda da tatuagem no corpo, não tivemos sucesso pleno na febre do orkut. Lá atrás, minha esposa e eu conseguimos frear o desejo de nossas meninas, na época com 14 e 16 anos, com o argumento quase que autoritário de que fariam a bendita tatuagem quando fossem donas dos próprios narizes. Ambas atingiram esse estágio e o desejo da tatuagem, felizmente, ficou apenas como uma cômica lembrança do passado. Não obstante, por essa mesma época também, as duas foram tragadas pela pandemia do orkut, ainda que tivéssemos acrescentados à profilaxia doses maiores de livros e muito papo.
          Não houve escapatória, e o jeito, como se deve fazer com qualquer conjunto de sintomas que levam a uma síndrome, foi estudá-la e torcer para que a impressão inicial advinda dos famosos estivesse errada.
          Não estava, infelizmente. Por entre a fresta do orkut das “meninas”, deparei-me com uma imensa “comunidade” que, a princípio, poderia até encantar a um socialista que conheceu Marx apenas através da boca de terceiros, dada a unidade de pensamento; que poderia até encantar também um leitor excitado que acharia estar diante de um novo gênero literário, o “de perfil”, à semelhança talvez do “de cordel”. Porém, além de uma arriscada rede que passa informações valiosas de seu cotidiano que podem cair em mãos inescrupulosas, isto de um lado, deparei-me, de outro, com uma imensidade de informações que não condizem com o real, pois, só para citar um exemplo, se fossem verdadeiros apenas dez por cento dos que se declaram leitores, nós estaríamos bem servidos enquanto nação próspera. O próprio “Bitôvi” ali apreciado teria um espaçozinho nas FM, estas, por sua vez, perversamente idênticas do Oiapoque ao Chuí.
          Provocado, o corpo se vira com os seus anticorpos. Assim aconteceu com as minhas duas “meninas”, uma agora a meio caminho da engenharia de automação e a outra já em exercício da geo-física, que me ajudam neste momento a pegar o megafone e tentar organizar a Primeira Parada dos Sem-Orkut e Genéricos.
          Em prol de nosso orgulho, vamos à luta!



Gafe sobre a ruína

          Para quem tenta pela segunda vez chegar ao Palácio do Planalto, o candidato José Serra parece não ter avançado no seu ideário que pretende tomar nas mãos as rédeas do país. Pode-se até creditar a gafe ao momento de pesar e comoção geral por que passamos, em razão dos tremores que ainda irradiam e que por longo tempo se farão irradiar do epicentro Haiti, mas ouvir-lhe dizer que a médica Zilda Arns, à parte lá a sua vocação de freira sem hábito, é a grande responsável pela queda da mortalidade infantil, vamos respeitar, é no mínimo assinar um atestado de falta de tato e visão sobre os problemas concretos que se abatem sobre o Brasil, ou firmar uma incompetência durante os últimos vinte anos, doze dos quais, se somados os dois de Collor e os dois de Itamar, estiveram sob influência tucana.

          Ora, se de fato a coisa se desse de forma tão simples e tão providencial como se vem pondo em difusão, que tal o candidato se aproveitar da ideia e debelar de vez com o problema da mortalidade infantil no Brasil, que a acompanha desde o seu próprio engatinhar, e criar o Ministério da Pastoral da Criança? Se a Pastoral realizou esse profundo milagre, imaginem-na dotada de recursos públicos próprios e ter um por cento somente da propaganda estatal para veicular seus propósitos? Seria muito interessante.

          E que tal, aproveitando esse tipo de sociologia ministrada em porta de cabaré, ampliar essa mesma ideia e usar uma espécie de soro caseiro, em que se mistura livro e educação de qualidade, e acolher o saldo positivo da primeira fase do homem e protegê-lo em sua segunda fase com a criação do Ministério da Pastoral do Adolescente?

         Vejo com algum desconforto o nível dos debates que se avizinha com a campanha à Presidência da República. O prenúncio é de que se fortifique a política do assistencialismo pelo assistencialismo, em detrimento de um planejamento verdadeiramente seguro e sério.

     


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